#MemóriaPop: Cazuza, uma saudade eterna - Palco Pop
Colunas | Publicado por Viviane Loyola em 13 de setembro de 2018.
#MemóriaPop: Cazuza, uma saudade eterna

É sempre bom conhecer mais sobre artistas e bandas com bastante tempo de atividade e que continuam ativas ou influenciando os novos talentos, né? Esse é o objetivo da coluna Memória Pop. A cada semana um artista diferente, sua biografia, discografia, reflexões variadas sobre estilo, trajetória e legado dentro do pop.

Férias escolares de julho. No terrível 07 de julho de 1990. Isso não se faz, a gente não deveria perder ídolos na adolescência. Fica a marca eterna. Logo ele que cantava: “meus heróis morreram de overdose, meus inimigos estão no poder”. Lamentava ter perdido ídolos, e nós, o
perdemos.

Não foi o único. Odeio essa doença por levar tantos bons, com isso a arte perde muito. Cazuza se foi precocemente aos 32. A Aids antes do coquetel, o rock nacional em seu apogeu, do que me lembro chorei o resto das férias ouvindo Codinome Beija-flor. A mais bela e melancólica das canções.

Cazuza foi cantor, compositor, poeta transgressor. Vocalista e principal letrista do Barão Vermelho, depois seguiu carreira solo. Isso todo mundo sabe ou deveria saber, conhecer sua musicalidade é obrigatório. Não sei se sabem é sobre sua personalidade irreverente e fora dos padrões da década de 80. Cazuza conviveu abertamente com a doença, falou sem medo de sua bissexualidade, de como se drogou na juventude e de seu vício em álcool. Subiu ao palco debilitado, magro, cabelos ralos, chegou a pesar 40 quilos, rosto manchado, e foi capa da Veja em 26 de abril de 1989 em uma controversa matéria com a seguinte frase: “Uma vítima da Aids agoniza em praça pública”. Fãs do cantor, jornalistas de outros veículos e artistas acusaram a revista de sensacionalismo e mau agouro. O próprio Cazuza se manifestou
contrário ao enfoque dado.

Alguém faz ideia da revolução que foi? Os artistas não se assumiam gays na época. Não se diziam doentes. Ele quebrou tudo. Rebelde, boêmio, polêmico, deu declaração se assumindo soropositivo. Concedeu diversas entrevistas. Foi autor dos versos “Senhoras e senhores trago boas novas. Vi a cara da morte e ela estava viva”. Ao contrário de Renato Russo, outro ídolo pop que se foi pouco depois pela mesma doença, Cazuza não se recolheu perto do fim. Costumava dizer que o que lhe mantinha vivo era a possibilidade de continuar criando suas músicas e fazendo shows.

cazuza bissexual soropositivo

Cazuza na capa da Veja

O que é um ídolo pop? É o que emplaca um hit atrás do outro? O Barão Vermelho se encaixa nesta categoria. Começou estourando nas rádios o tema do filme Bete Balanço, em 1984. Conquistou disco de ouro nesse mesmo ano com outros sucessos como “Maior Abandonado” e “Por que a gente é assim?“.

Em janeiro de 1985, o grupo se apresentou na primeira edição do Rock in Rio. Eu tinha 11 anos. Vi pela televisão. Amei Cazuza para sempre e sei naquele momento ele conquistou uma legião de fãs. Entendi que um ídolo pop é aquele que faz sucesso nas rádios, vende muitos discos, e sim emplaca um hit atrás do outro, mas tem um algo a mais. Um ídolo pop faz milhares de pessoas cantarem junto em shows históricos, em mega-festivais de celebração da música e da liberdade. Um ídolo pop lança moda.

Barão Vermelho no Rock in Rio

Barão Vermelho no Rock in Rio

Após sua participação no Barão Vermelho, e da apresentação elogiada no Rock in Rio, Cazuza partiu para uma carreira solo ainda em 1985. Nessa fase seu primeiro sucesso foi a música “Exagerado“, faixa-título do álbum e composta em parceria com Leoni, outro expoente do rock dos 80. A canção “Só As Mães São Felizes” foi vetada pela censura. Gravou o segundo álbum no segundo semestre de 1986 e o carro-chefe foi a música “O Nosso Amor A Gente Inventa“.

A AIDS se manifestou em 1987 em uma internação por pneumonia. Chegou a ser levado por seus pais aos Estados Unidos, Boston, para tratamento com AZT. Ao voltar, no começo de dezembro de 1987, Cazuza mesmo doente gravou novo disco. Lançou os hits “Ideologia” e “Brasil“.
Esta última canção, em versão de Gal Costa, foi tema de abertura da telenovela Vale Tudo, da Rede Globo, e faturou todos os prêmios de música do ano. Incrível como, às vésperas das eleições de 2018, a letra permanece atual. Como Cazuza permanece sendo um gigante do pop-rock brasileiro. Único e singular. A saudade é porque não houve nem haverá outro Cazuza porque o que ele cantou e o que ele fez no auge do conservadorismo dos 80 ficou para sempre na história.

Chorei outra vez aqui quando pensei e escrevi sobre ele. Mas acho que é mais alegria que tristeza. Alegria de o ter visto no seu esplendor, de ter vivido seu tempo, de me lembrar dele ainda hoje e ter suas músicas a embalar estas palavras.

 

Gratidão e eternas saudades, icone.

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